• A Igreja e a Política - por Geovania de Sá

A Igreja e a Política - por Geovania de Sá

15 Abr, 2019 15:01:32 - Artigo

Florianópolis (SC)

Durante muitos anos a religião possuía um papel determinante na política, de tal forma que Estado e Igreja se fundiam em uma única estrutura. Porém, no século XVI, a Reforma Protestante rompe esta ideia de fusão e desperta a busca pela verdade nas escrituras, fomentando o grito de liberdade, de democracia, e possibilitando ao mundo alcançar a modernidade, o respeito e a igualdade.

Apenas no Brasil dos anos 80 é que, por fim, conseguimos perceber o aparecimento de uma nova corrente do cristianismo crescendo entre a população. Os evangélicos, que, até então, possuíam discreta atuação no cenário político e social, acabaram ganhando visibilidade durante o processo eletivo para a Assembleia Constituinte de 1986, quando criaram uma bancada suprapartidária composta por diversos parlamentares ligados à diferentes agremiações do protestantismo.

Hoje essa mesma corrente representa 15% dos eleitos na Câmara de Deputados. Somos 112 parlamentares na bancada evangélica, sendo 96 deputados e 16 senadores, defendendo a preservação dos nossos valores. E este aumento na representatividade é reflexo, exatamente, do maior número de cristãos no Brasil. De acordo com o último censo do IBGE, realizado em 2010, cerca de 86% da população brasileira é cristã, sendo que 64,6% pertencem a Igreja Católica (aproximadamente 133 milhões de pessoas) e 22,2% se denominam evangélicos, ou seja, mais de 42 milhões de brasileiros. Nosso país desponta como o 2º colocado no ranking de países com a maior população cristã no mundo, ficando atrás apenas dos EUA.

Importante ainda destacar que o crescimento de evangélicos no Brasil foi de 60% entre o censo de 2000 e 2010, e estudos periódicos de tendência mostram que, se este crescimento for mantido, é possível que, em 10 ou 15 anos, nosso país tenha a maioria de sua população evangélica. É justamente esse o ponto principal em que a religião e a política se cruzam. A partir dos anos 80 e 90 começaram as migrações internas no país, movimento de deslocamento das populações mais pobres para as periferias das regiões metropolitanas. Foi neste momento que os evangélicos ganharam força e estas periferias acabaram se tornando os locais onde o Estado não chega.

Fazendo uma analogia, o Estado é como um grande transatlântico que demora muito para mudar a rota e chegar em um novo lugar, devido sua grande estrutura burocrática. Já as Igrejas Evangélicas podem ser comparadas às pequenas embarcações, que conseguem penetrar em áreas inalcançáveis para outros segmentos. São setores sociais e espaços geográficos que, por sua precariedade de condições, enfrentam a completa ausência do poder público. Mas para nós, evangélicos, não existe espaço vazio. Atuamos onde normalmente ninguém chega para atender as necessidades mais básicas da população.

É a Igreja que desempenha o papel de chegar onde o governo não chega. É ela que acolhe o desamparado e promove a inclusão e a restauração. É quem abraça a criança desde o berço, a envolve com os ensinamentos bíblicos e com as atividades sociais. E é por meio da música, das artes, do esporte e, principalmente, do amor e respeito ao próximo (princípio do evangelho) que conseguimos afastar essas crianças e adolescentes dos ambientes negativos da atualidade marginalizada. Foi exatamente a partir dessa percepção que o movimento evangélico começou a ganhar sua força política.

Assim como eu, muitos evangélicos decidiram aceitar o chamado para a vida pública para defender e lutar pela classe que representam. Nós não queremos levar a igreja até os centros de decisão. A igreja espiritual não precisa disso. O que queremos, como qualquer outro setor da sociedade, como empresários, sindicatos, negros, mulheres, LGBTs, é dar a nossa livre contribuição, em um idioma comum a todos, para causas que consideramos importantes a serem defendidas.

Não pedimos nada além de discutirmos nossos pontos de vista em pé de igualdade e sempre com o respeito pelos direitos da minoria. Queremos apenas ajudar o Brasil a reencontrar o seu caminho: a justiça social, a igualdade, o amparo aos que mais precisam, independentemente de credo, raça ou gênero.

Por outro lado, sabemos que haverá divergência de opinião em muitos pontos, mesmo dentro da própria bancada evangélica, e isto faz parte da democracia. Há evangélicos contra e a favor das reformas trabalhista e previdenciária, por exemplo. E há aqueles que, como eu, acham que a reforma da previdência é necessária, mas que ainda não chegamos a um texto justo, que precisa ser aprimorado no Congresso para a verdadeira promoção da justiça social.

Apesar disso, encontramos convergência em pontos e valores fundamentais, sobretudo, quando observamos a realidade do nosso país. Para nós, na sociedade brasileira, como em diversas partes do mundo, muitos estão esquecendo que o que mantém de fato uma democracia sólida são os valores de amor e respeito que cultivamos desde cedo no seio de nossas famílias, nas escolas e na própria Igreja.

Precisamos também entender que vivemos, sim, em um Estado laico. Mas, a laicidade não diz respeito à falta de religião, muito pelo contrário. Viver num país que se denomina laico é ter o privilégio de conviver em uma sociedade onde a pluralidade de ideais e opiniões serão respeitados, onde o amor ao próximo e a luta diária pela igualdade e pelo bem-estar social serão os pilares que guiarão o trabalho daqueles que foram eleitos pelo povo, para representá-lo.

Para nós, esquecermos desses valores cristãos faz com que famílias se desfaçam, laços comunitários se afrouxem e problemas de toda a sorte explodam diante dos nossos olhos. Assim, creio que nossa principal missão é reabilitar no espaço público temas, valores e expressões que, muitas vezes, são deixados de lado.

Sabemos que assuntos polêmicos surgirão durante esse processo, até porque fizemos parte de uma Casa que conta com 513 deputados, cada um com suas vivências e credos. Porém se deixarmos de encarar e debater acerca de nossas divergências, perderemos uma oportunidade de enriquecimento mútuo de opiniões. Seríamos não somente mais intolerantes, mas também politicamente mais pobres. E, acima de tudo, perderíamos chances valiosas de encontrar, em meio às diferenças, aquilo que nos une. E isto não pode acontecer.

Agradeço a sua leitura e que o nosso Deus continue nos abençoando e nos oportunizando momentos de aprendizado como este e de amor ao próximo.

GEOVANIA DE SÁ

REDAÇÃO JINEWS
Postado por REDAÇÃO JINEWS

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